sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Perante o silêncio do Presidente da República da Guiné-Bissau, que se confunde com a falta de soluções, ao abrigo das suas competências constitucionais

Por,  Fernando Casimiro

Perante o silêncio do Presidente da República, que se confunde com a falta de soluções, ao abrigo das suas competências constitucionais, para a resolução da crise, e quando a CEDEAO emitiu um comunicado oficial anunciando uma nova missão de mediação à Guiné-Bissau, amanhã, 05.11.2016, para lá de tudo quanto já escrevi sobre esta crise política guineense, não posso deixar de insistir na questão fundamental para se ultrapassar a crise, ou seja, o desbloqueio do Parlamento.

Para que o poder possa ser devolvido ao PAIGC, partido vencedor das eleições legislativas de 2014, com 57 Deputados, ou seja, com uma maioria absoluta, é imperativo que o PAIGC GARANTA que tem até ao presente, essa MAIORIA ABSOLUTA.

A questão que todos sabemos responder até aqui é que de facto, o PAIGC teve, independentemente do chumbo do seu Programa de Governo no Parlamento a 23.12.2015, uma maioria absoluta na configuração parlamentar, ou seja, na Assembleia Nacional Popular.

Uma maioria que se mantinha, independentemente do chumbo do seu Programa, consequente da abstenção de 15 dos seus Deputados.

Ao invés de tirar ilações da abstenção dos 15 Deputados do seu grupo parlamentar, e por via disso, encetar consultas e debates internos, no sentido de congregar os 15 Deputados nos compromissos e objectivos do partido, o PAIGC decidiu agir de forma radical e impiedosa, expulsando-os do partido, mas, também, e numa acção ilegal e inconstitucional, por ter seus dirigentes a dirigir a Presidência da Mesa do Parlamento, bem como a maioria que dirige a Comissão Permanente da Assembleia Nacional Popular, enquanto Deputados, fez com que aos 15 Deputados que se abstiveram na votação do Programa do Governo fossem retirados os mandatos para os quais tinham sido eleitos nas listas do PAIGC.

Desde então, a Assembleia Nacional Popular passou a agir não como um órgão de soberania ao serviço do Povo, mas como uma sede partidária ao serviço do PAIGC.

Assistimos a disputas políticas e jurídicas desde então, sendo que, o Supremo Tribunal de Justiça, goste-se ou não, concorde-se ou não, decidiu, pela reintegração dos 15 Deputados na lista de Deputados eleitos nas eleições legislativas de 2014.

Se não foram reintegrados no grupo parlamentar do PAIGC e porque não compete ao Supremo Tribunal de Justiça essa decisão, mas sim ao próprio PAIGC e aos 15 Deputados em causa, como dizer que o PAIGC continua a ter a maioria absoluta conquistada aquando das eleições legislativas de 2014?

Tudo o que se seguiu até aos dias de hoje, todos sabemos.

Sabemos por exemplo que o PAIGC ficou com 42 Deputados, ao invés dos 57 conquistados nas urnas e que o PRS manteve os seus 41 Deputados.

Sabemos igualmente que face ao bloqueio no parlamento, o PRS decidiu negociar com os 15 Deputados, para garantir ao Presidente da República que tinham uma solução governativa que seria viabilizada em função de uma maioria sustentada no Parlamento, dos seus 41 Deputados mais os 15 Deputados que deixaram de pertencer ao grupo parlamentar do PAIGC mas que não deixaram de ser Deputados, face ao Acórdão do STJ que lhes restituiu os mandatos retirados ilegal e inconstitucionalmente pela Comissão Permanente da ANP.

Se estamos a falar da resolução da crise, ignorando a necessidade de esclarecer se o PAIGC está disposto, de boa-fé, a reintegrar os seus 15 Deputados, para voltar a ter a tal maioria absoluta conquistada nas urnas em 2014, como podemos insistir na devolução do poder ao PAIGC?

Desde a assinatura do Acordo de Conacri, o PAIGC conseguiu reintegrar no partido os 15 dirigentes e Deputados expulsos?

Como pode o PAIGC afiançar ao Presidente da República que tem uma solução governativa que será viabilizada no Parlamento, quando tem, legalmente, até ao presente momento, apenas 42 Deputados, num universo de 102, o que não constitui maioria, para além de, o PRS e os 15 Deputados não inscritos em nenhum grupo parlamentar, continuarem a manter o acordo de governação sustentado por uma maioria parlamentar consequente da perda de mandatos do PAIGC e que permitiu a nomeação do Baciro Djá como Primeiro-ministro?

O que é que constatamos para uma aprendizagem com os erros cometidos entre os 6 pontos do Acordo de Bissau e os 10 pontos do Acordo de Conacri, para hoje termos uma melhor percepção de como solucionar a crise?

Constatamos que é inconstitucional ser o Presidente da República a propor nomes para o cargo de Primeiro-ministro e com o agravante de o nomeado ter que ser pessoa de confiança do Presidente da República. Este ponto constante do Acordo de Conacri, deve ser pura e simplesmente eliminado.

Constatamos que o Presidente da República que também é parte da crise política, apenas deve e tem que continuar a incentivar a busca de soluções sustentadas para a resolução da crise, com base na Constituição e nas Leis da República, já que é ele o Garante da Constituição, sensibilizando todas as partes para a necessidade de um diálogo promotor de consensos, de boa-fé, da restauração da confiança entre irmãos, visando apenas e só, salvaguardar o Interesse Nacional, quiçá, servir a Guiné-Bissau e os Guineenses.

Constatamos que o consenso não deve sobrepor-se à Constituição e às Leis da República, quando não houve até agora nenhuma ruptura constitucional ou da legalidade democrática. Apelaríamos a um consenso face a uma situação atípica de ruptura da legalidade democrática e constitucional, com o fito de se retomar a dita legalidade democrática e constitucional, com base na Constituição e nas Leis da República.

Constatamos que o consenso que se pretende e faz sentido, é a necessidade de todos se sentarem à mesma mesa, olhos nos olhos, discutirem numa perspectiva de diálogo positivo e construtivo, com base no que está regulado na Constituição e nas Leis da República, para que a crise seja ultrapassada.

Se optarmos pelo consenso que desvirtua e desrespeita a Constituição e as Leis da República, teremos problemas logo a seguir, porque a Constituição e as Leis não podem ser interpretadas com base na conveniência, mas sim, na universalidade interpretativa da Lei, tendo em conta a afirmação do Estado de Direito e democrático.

Se o PAIGC conseguir negociar com os seus 15 ex-dirigentes e Deputados da Nação, reintegrando-os no seu grupo parlamentar, creio que o próprio PRS facilitaria tal iniciativa, em nome do Interesse Nacional, o que se traduziria no desbloqueio do Parlamento, quiçá, na viabilização da acção governativa e na retoma funcional das instituições do Estado que não só o Parlamento.

Conseguindo a reconciliação interna e a garantia de ter de novo 57 Deputados no Parlamento, o Presidente da República não teria nenhuma legitimidade para recusar ao PAIGC a indicação de um Primeiro-ministro.

O PAIGC poderia voltar a promover a inclusão governativa se assim o entendesse e aqui trata-se de uma questão de consenso que não fere, não viola, não contraria a Constituição nem as Leis da República, convidando o PRS e os demais partidos com ou sem assento parlamentar a fazerem parte do Governo.

Se o PAIGC não cumprir com a sua parte do Acordo de Conacri, não faz sentido que insista na indicação de um nome para o cargo de Primeiro-ministro, pois sem a sua reconciliação interna, que garanta o regresso e a reintegração dos seus ex-dirigentes, sobretudo no seu grupo parlamentar, continua a ter apenas 42 Deputados ao invés dos 57 inicialmente confirmados aquando das eleições legislativas de 2014.

Constatamos que o Presidente da República mantém a sua decisão de não dissolver o Parlamento. Podemos concordar ou discordar da sua decisão, cientes de que há prós e contras, porém, entre dissolver e não dissolver o Parlamento, face à realidade presente e ao estado da crise, qualquer que fosse a decisão do Presidente da República, seria o actual governo em funções a gerir a governação até à realização de novas eleições, que poderiam ser realizadas apenas quando estivessem reunidas as condições financeiras, técnicas e operacionais, para tal, independentemente do prazo estabelecido na Lei Eleitoral.

Como é que podemos falar na implementação dos 10 pontos do Acordo de Conacri, com base num suposto consenso que afinal, não chegou a existir, face às diversas interpretações e consequentes desencontros de posicionamentos dos envolvidos e participantes?

Constatamos que o que continua a fomentar a crise política é o bloqueio no Parlamento e com base no Acordo de Conacri, o PAIGC e o grupo dos 15 Deputados e ex-dirigentes do referido partido são a chave para a solução da crise. Não está no PRS e muito menos no Presidente da República, a solução para a reintegração dos 15 ex-dirigentes do PAIGC no PAIGC.

Cabe ao PAIGC, à sua estrutura de liderança, assumir uma postura de humildade, de reconhecimento dos erros até aqui cometidos, para aproveitar esta oportunidade, que lhe é concedida no sentido de reivindicar legalmente o poder conquistado nas urnas, caso consiga de facto, voltar a confirmar que detém a maioria absoluta de mandatos na Assembleia Nacional Popular.

Sem isso, nenhum Acordo desbloqueará o Parlamento e nenhuma solução governativa terá legitimidade para substituir o actual governo, que foi nomeado depois de o Presidente da República ter auscultado os partidos políticos com assento parlamentar, tal como estabelece a Constituição da República e de ter recebido garantias do PRS em como para além dos seus 41 Deputados, contava com o apoio dos 15 Deputados não inscritos em nenhum grupo parlamentar, para viabilizar a governação, através da legitimação no Parlamento, face à configuração parlamentar que advinha dessa aliança.

O PAIGC já devia ter feito a sua parte, quer para a reconciliação com os seus 15 ex-dirigentes, mas também, para uma harmonização com o PRS, a bem do apaziguamento da crise, tendo em conta o sacrifício, o sofrimento e o desespero do povo guineense.

Para quê tanta intransigência, quando ao invés de se estar a defender o Interesse Nacional, está-se a prejudicar o Interesse Nacional?

Que análises, que reflexões, que propostas de soluções não foram apresentadas por filhos da Guiné-Bissau, para o fim desta crise?

Vamos todos aceitar e reconhecer (povo, políticos, governantes e Comunidade Internacional), que é preciso, de facto, dizer BASTA?!

Há ou não coragem para centrar o essencial da crise no desbloqueio do Parlamento e não na nomeação de um novo Primeiro-ministro?


Positiva e construtivamente. 

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