Perante o silêncio do Presidente da
República, que se confunde com a falta de soluções, ao abrigo das suas
competências constitucionais, para a resolução da crise, e quando a CEDEAO
emitiu um comunicado oficial anunciando uma nova missão de mediação à
Guiné-Bissau, amanhã, 05.11.2016, para lá de tudo quanto já escrevi sobre esta
crise política guineense, não posso deixar de insistir na questão fundamental
para se ultrapassar a crise, ou seja, o desbloqueio do Parlamento.
Para que o poder possa ser devolvido ao
PAIGC, partido vencedor das eleições legislativas de 2014, com 57 Deputados, ou
seja, com uma maioria absoluta, é imperativo que o PAIGC GARANTA que tem até ao
presente, essa MAIORIA ABSOLUTA.
A questão que todos sabemos responder até
aqui é que de facto, o PAIGC teve, independentemente do chumbo do seu Programa
de Governo no Parlamento a 23.12.2015, uma maioria absoluta na configuração
parlamentar, ou seja, na Assembleia Nacional Popular.
Uma maioria que se mantinha,
independentemente do chumbo do seu Programa, consequente da abstenção de 15 dos
seus Deputados.
Ao invés de tirar ilações da abstenção dos 15
Deputados do seu grupo parlamentar, e por via disso, encetar consultas e
debates internos, no sentido de congregar os 15 Deputados nos compromissos e
objectivos do partido, o PAIGC decidiu agir de forma radical e impiedosa,
expulsando-os do partido, mas, também, e numa acção ilegal e inconstitucional,
por ter seus dirigentes a dirigir a Presidência da Mesa do Parlamento, bem como
a maioria que dirige a Comissão Permanente da Assembleia Nacional Popular,
enquanto Deputados, fez com que aos 15 Deputados que se abstiveram na votação
do Programa do Governo fossem retirados os mandatos para os quais tinham sido
eleitos nas listas do PAIGC.
Desde então, a Assembleia Nacional Popular
passou a agir não como um órgão de soberania ao serviço do Povo, mas como uma
sede partidária ao serviço do PAIGC.
Assistimos a disputas políticas e jurídicas
desde então, sendo que, o Supremo Tribunal de Justiça, goste-se ou não,
concorde-se ou não, decidiu, pela reintegração dos 15 Deputados na lista de
Deputados eleitos nas eleições legislativas de 2014.
Se não foram reintegrados no grupo
parlamentar do PAIGC e porque não compete ao Supremo Tribunal de Justiça essa
decisão, mas sim ao próprio PAIGC e aos 15 Deputados em causa, como dizer que o
PAIGC continua a ter a maioria absoluta conquistada aquando das eleições
legislativas de 2014?
Tudo o que se seguiu até aos dias de hoje,
todos sabemos.
Sabemos por exemplo que o PAIGC ficou com 42
Deputados, ao invés dos 57 conquistados nas urnas e que o PRS manteve os seus
41 Deputados.
Sabemos igualmente que face ao bloqueio no
parlamento, o PRS decidiu negociar com os 15 Deputados, para garantir ao Presidente
da República que tinham uma solução governativa que seria viabilizada em função
de uma maioria sustentada no Parlamento, dos seus 41 Deputados mais os 15
Deputados que deixaram de pertencer ao grupo parlamentar do PAIGC mas que não
deixaram de ser Deputados, face ao Acórdão do STJ que lhes restituiu os
mandatos retirados ilegal e inconstitucionalmente pela Comissão Permanente da
ANP.
Se estamos a falar da resolução da crise,
ignorando a necessidade de esclarecer se o PAIGC está disposto, de boa-fé, a
reintegrar os seus 15 Deputados, para voltar a ter a tal maioria absoluta
conquistada nas urnas em 2014, como podemos insistir na devolução do poder ao
PAIGC?
Desde a assinatura do Acordo de Conacri, o
PAIGC conseguiu reintegrar no partido os 15 dirigentes e Deputados expulsos?
Como pode o PAIGC afiançar ao Presidente da
República que tem uma solução governativa que será viabilizada no Parlamento,
quando tem, legalmente, até ao presente momento, apenas 42 Deputados, num
universo de 102, o que não constitui maioria, para além de, o PRS e os 15
Deputados não inscritos em nenhum grupo parlamentar, continuarem a manter o
acordo de governação sustentado por uma maioria parlamentar consequente da
perda de mandatos do PAIGC e que permitiu a nomeação do Baciro Djá como
Primeiro-ministro?
O que é que constatamos para uma aprendizagem
com os erros cometidos entre os 6 pontos do Acordo de Bissau e os 10 pontos do
Acordo de Conacri, para hoje termos uma melhor percepção de como solucionar a
crise?
Constatamos que é inconstitucional ser o
Presidente da República a propor nomes para o cargo de Primeiro-ministro e com
o agravante de o nomeado ter que ser pessoa de confiança do Presidente da
República. Este ponto constante do Acordo de Conacri, deve ser pura e simplesmente
eliminado.
Constatamos que o Presidente da República que
também é parte da crise política, apenas deve e tem que continuar a incentivar
a busca de soluções sustentadas para a resolução da crise, com base na
Constituição e nas Leis da República, já que é ele o Garante da Constituição,
sensibilizando todas as partes para a necessidade de um diálogo promotor de
consensos, de boa-fé, da restauração da confiança entre irmãos, visando apenas
e só, salvaguardar o Interesse Nacional, quiçá, servir a Guiné-Bissau e os
Guineenses.
Constatamos que o consenso não deve
sobrepor-se à Constituição e às Leis da República, quando não houve até agora
nenhuma ruptura constitucional ou da legalidade democrática. Apelaríamos a um
consenso face a uma situação atípica de ruptura da legalidade democrática e
constitucional, com o fito de se retomar a dita legalidade democrática e
constitucional, com base na Constituição e nas Leis da República.
Constatamos que o consenso que se pretende e
faz sentido, é a necessidade de todos se sentarem à mesma mesa, olhos nos
olhos, discutirem numa perspectiva de diálogo positivo e construtivo, com base
no que está regulado na Constituição e nas Leis da República, para que a crise
seja ultrapassada.
Se optarmos pelo consenso que desvirtua e
desrespeita a Constituição e as Leis da República, teremos problemas logo a
seguir, porque a Constituição e as Leis não podem ser interpretadas com base na
conveniência, mas sim, na universalidade interpretativa da Lei, tendo em conta
a afirmação do Estado de Direito e democrático.
Se o PAIGC conseguir negociar com os seus 15
ex-dirigentes e Deputados da Nação, reintegrando-os no seu grupo parlamentar,
creio que o próprio PRS facilitaria tal iniciativa, em nome do Interesse
Nacional, o que se traduziria no desbloqueio do Parlamento, quiçá, na
viabilização da acção governativa e na retoma funcional das instituições do
Estado que não só o Parlamento.
Conseguindo a reconciliação interna e a
garantia de ter de novo 57 Deputados no Parlamento, o Presidente da República
não teria nenhuma legitimidade para recusar ao PAIGC a indicação de um
Primeiro-ministro.
O PAIGC poderia voltar a promover a inclusão
governativa se assim o entendesse e aqui trata-se de uma questão de consenso
que não fere, não viola, não contraria a Constituição nem as Leis da República,
convidando o PRS e os demais partidos com ou sem assento parlamentar a fazerem
parte do Governo.
Se o PAIGC não cumprir com a sua parte do
Acordo de Conacri, não faz sentido que insista na indicação de um nome para o
cargo de Primeiro-ministro, pois sem a sua reconciliação interna, que garanta o
regresso e a reintegração dos seus ex-dirigentes, sobretudo no seu grupo
parlamentar, continua a ter apenas 42 Deputados ao invés dos 57 inicialmente
confirmados aquando das eleições legislativas de 2014.
Constatamos que o Presidente da República
mantém a sua decisão de não dissolver o Parlamento. Podemos concordar ou
discordar da sua decisão, cientes de que há prós e contras, porém, entre
dissolver e não dissolver o Parlamento, face à realidade presente e ao estado
da crise, qualquer que fosse a decisão do Presidente da República, seria o
actual governo em funções a gerir a governação até à realização de novas
eleições, que poderiam ser realizadas apenas quando estivessem reunidas as
condições financeiras, técnicas e operacionais, para tal, independentemente do
prazo estabelecido na Lei Eleitoral.
Como é que podemos falar na implementação dos
10 pontos do Acordo de Conacri, com base num suposto consenso que afinal, não
chegou a existir, face às diversas interpretações e consequentes desencontros
de posicionamentos dos envolvidos e participantes?
Constatamos que o que continua a fomentar a
crise política é o bloqueio no Parlamento e com base no Acordo de Conacri, o
PAIGC e o grupo dos 15 Deputados e ex-dirigentes do referido partido são a
chave para a solução da crise. Não está no PRS e muito menos no Presidente da
República, a solução para a reintegração dos 15 ex-dirigentes do PAIGC no
PAIGC.
Cabe ao PAIGC, à sua estrutura de liderança,
assumir uma postura de humildade, de reconhecimento dos erros até aqui
cometidos, para aproveitar esta oportunidade, que lhe é concedida no sentido de
reivindicar legalmente o poder conquistado nas urnas, caso consiga de facto,
voltar a confirmar que detém a maioria absoluta de mandatos na Assembleia
Nacional Popular.
Sem isso, nenhum Acordo desbloqueará o
Parlamento e nenhuma solução governativa terá legitimidade para substituir o
actual governo, que foi nomeado depois de o Presidente da República ter
auscultado os partidos políticos com assento parlamentar, tal como estabelece a
Constituição da República e de ter recebido garantias do PRS em como para além
dos seus 41 Deputados, contava com o apoio dos 15 Deputados não inscritos em
nenhum grupo parlamentar, para viabilizar a governação, através da legitimação
no Parlamento, face à configuração parlamentar que advinha dessa aliança.
O PAIGC já devia ter feito a sua parte, quer
para a reconciliação com os seus 15 ex-dirigentes, mas também, para uma
harmonização com o PRS, a bem do apaziguamento da crise, tendo em conta o
sacrifício, o sofrimento e o desespero do povo guineense.
Para quê tanta intransigência, quando ao
invés de se estar a defender o Interesse Nacional, está-se a prejudicar o
Interesse Nacional?
Que análises, que reflexões, que propostas de
soluções não foram apresentadas por filhos da Guiné-Bissau, para o fim desta
crise?
Vamos todos aceitar e reconhecer (povo,
políticos, governantes e Comunidade Internacional), que é preciso, de facto,
dizer BASTA?!
Há ou não coragem para centrar o essencial da
crise no desbloqueio do Parlamento e não na nomeação de um novo
Primeiro-ministro?
Positiva e construtivamente.
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