O MPLA está no poder desde 1975 e por lá
vai ficar. Com o poder absoluto que tem nas mãos (é também o presidente do MPLA
e chefe do Governo), José Eduardo dos Santos é um dos ditadores ou, na melhor
das hipóteses, um presidente autocrático, há mais tempo em exercício.
Por Orlando Castro
África, em nada abona do ponto de vista
democrático e civilizacional a seu favor. Sabe todo o mundo, mas sobretudo e
mais uma vez África, que se o poder corrompe, o poder absoluto corrompe
absolutamente. É o caso em Angola.
Só em ditadura, mesmo que legitimada
pelos votos comprados a um povo que quase sempre pensa com a barriga (vazia) e
não com a cabeça, é possível estar tantos anos no poder. Em qualquer estado de
direito democrático tal não seria possível.
Aliás, e Angola não foge infelizmente à
regra, África é um alfobre constante e habitual de conflitos armados porque a
falta de democraticidade obriga a que a alternância política seja conquistada
pela linguagem das armas. Há obviamente outras razões, mas quando se julga que
eleições são só por si sinónimo de democracia está-se a caminhar para a
ditadura.
Com Eduardo dos Santos passa-se
exactamente isso. A guerra legitimou tudo o que se consegue imaginar de mau.
Permitiu ao actual presidente perpetuar-se no poder, tal como como permitiu que
a UNITA dissesse que essa era (e pelo que se vai vendo até parece que teve
razão) a única via para mudar de dono do país.
É claro que, é sempre assim nas
ditaduras, o povo foi sempre e continua a ser (as eleições não alteraram a
génese da ditadura, apenas a maquilharam) carne para canhão.
Por outro lado, a típica hipocrisia das
grandes potências ocidentais, nomeadamente EUA e União Europeia, ajudou a dotar
José Eduardo dos Santos com o rótulo de grande estadista. Rótulo que não
corresponde ao produto. Essa opção estratégica de norte-americanos e europeus
tem, reconheça-se, razão de ser sobretudo no âmbito económico.
É muito mais fácil negociar com um
regime ditatorial do que com um que seja democrático. É muito mais fácil
negociar com alguém que, à partida, se sabe que irá estar na cadeira do poder
durante toda a vida, do que com alguém que pode ao fim de um par de anos ser
substituído pela livre escolha popular.
É, como acontece com José Eduardo dos
Santos, muito mais fácil negociar com o líder de um clã que representa quase
100 por cento do Produto Interno Bruto, do que com alguém que não seja dono do
país mas apenas, como acontece nas democracias, representante temporário do
povo soberano.
Bem visível na caso angolano é o facto
de, como em qualquer outra ditadura, quanto mais se tem mais se quer ter, seja
no país ou noutro qualquer sítio. Por muito pequeno que seja o ditador, o que
não é o caso de José Eduardo dos Santo, a História mostra-nos que tem sempre
apreciável fortuna espalhada pelo mundo, seja em bens imobiliários (como era
tradição) ou mais modernamente nos paraísos fiscais.
Reconheça-se, entretanto, a estatura
política de José Eduardo dos Santos, visível sobretudo a partir do momento em
que deixou de poder contar com Jonas Savimbi como o bode expiatório para tudo o
que de mal se passava em Angola.
Desde 2002, o presidente vitalício de
Angola tem conseguido fingir que democratiza o país e, mais do que isso,
conseguiu (embora não por mérito seu mas, isso sim, por demérito da UNITA)
domesticar completamente todos aqueles que lhe poderiam fazer frente.
Não creio que, até pelo facto de o país
ter estado em guerra dezenas de anos, José Eduardo dos Santos tenha as mãos
limpas de sangue. Aliás, nenhuma ditador com 36 anos de permanência seguida no
poder, tem as mãos limpas.
Mas essa também não é uma preocupação.
Quando se tem milhões, pouco importa como estão as mãos. Aliás, esses milhões
servem também para branquear, para limpar, para transplantar, para comprar
(quase) tudo e (quase) todos.
Tudo isto é possível com alguma
facilidade quando se é dono de um país rico e, dessa forma, se consegue tudo o
que se quer. E quando aparecem pessoas que não estão à venda mas incomodam e
ameaçam o trono, há sempre forma de as fazer chocar com uma bala.
Acresce, e nisso os angolanos não são
diferentes dos portugueses ou de qualquer outro povo, que continua válida a
tese de que “se não consegues vencê-los junta-te a eles”. Não admira por isso
que José Eduardo dos Santos tenha cada vez mais fiéis seguidores, sejam
militares, políticos, empresários e até supostos jornalistas.
É claro que, enquanto isso, o Povo
continua a ser gerado com fome, a nascer com fome, e a morrer pouco depois… com
fome. E a fome, a miséria, as doenças, as assimetrias sociais são chagas
imputáveis ao Poder. E quem está no poder há 36 anos é sempre o mesmo, José
Eduardo dos Santos. Até um dia, como é óbvio.
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